08/11/2023

A Causa Israelita

 

A CAUSA ISRAELITA

Por

Sasha van Lammeren


Desde o último dia 7 de Outubro, quando o Hamas perpetrou o mais nocivo e absurdo ataque contra Israel e o Premiê Benjamin Netanyahu declarou guerra ao grupo terrorista, o mundo parece ter se bifurcado em dois blocos: um pró-Israel e outro pró-Palestina. Como se a guerra entre Israel e Hamas fosse, na verdade, mais um capítulo da guerra histórica entre Israel e Palestina. Mas vamos dar alguns passos atrás e tentar perceber o que de fato está acontecendo aqui.


Parte I

Contexto histórico

 

Não vou me alongar demais no contexto histórico, visto que a história de Israel e da região da Palestina perpassa por mais de 5 mil anos, incluindo diversos impérios, guerras e mudanças de nome. Vou me concentrar em três fatos concretos, aceitos pela historiografia internacional, para dar o contexto histórico.

 

a). Israel sempre foi a terra original dos judeus, não dos Palestinos

 




A região, que originalmente era a terra dos israelitas, nunca teve o nome de ‘Palestina’. O nome Palestina foi dado pelos romanos no século II com o objetivo de ‘desjudaizar’ a região. Palestina vem de Philistia (que significa ‘Filístia’, em português), terra dos ‘filisteus’, povo que vivia na região em vermelho no mapa. Os filisteus eram adversários históricos dos israelitas, de modo que mudar o nome da região inteira para ‘Palestina’ não apenas era uma provocação, como também era uma forma de querer apagar a história do povo judeu na região (reinos de Israel e Judá).

 



Não é preciso, contudo, ir na Torá ou na Bíblia Sagrada cristã para averiguar que a região de Israel sempre foi do povo israelita. Historicamente as regiões de Israel e Judá eram uma região estabelecida e desenvolvida pelo povo judeu. Ao longo da história, após terem sido expulsos da região pelos Assírios (atual Síria) e Babilônios (atual Iraque), tiveram de se espalhar por diferentes regiões do planeta (muito embora uma boa parte dos judeus permaneceram no território por milénios). Os que foram expulsos foram escravizados, perseguidos e mortos em todos os continentes em que viveram. Apesar disso, prosperaram como povo, estando todos ligados a uma mesma história originária que remetia as Doze Tribos de Israel (mapa ao lado).




b). O sionismo e o seu objetivo histórico

 

O nome ‘sionismo’ vem da palavra ‘Sião’, uma referência a Jerusalém. No final do século XIX, diante do aumento do antissemitismo na Europa e do desenvolvimento do ‘nacionalismo’ como ideologia, surge um movimento que defendia a criação de um país para os judeus. Theodor Herzl, jornalista austríaco-judeu considerado o fundador do movimento, escreveu um livro chamado ‘O Estado Judeu’ (1896), na qual ele defendia a criação de um estado judeu na região da Palestina. Este foi o começo do sionismo político. Contudo, o sionismo como movimento foi muito mais do que isso.

 

A partir do Primeiro Congresso Sionista (1897), outros tipos de sionismos surgiram. Entre eles, o trabalhista (ou socialista), originário da ideia dos Kibutz (sociedades agrárias coletivas inspiradas na ideia socialista de partilha da propriedade pelos homens). Também surgiu o Sionismo Revisionista (liderado por Ze'ev Jabotinsky), que defendia a tese de que o estado judeu deveria se expandir territorialmente (sendo este movimento o precursor do atual partido Likud). Outra corrente foi o Sionismo religioso, que enfatizou a importância do Estado de Israel para as profecias religiosas.

 


Sionismo, portanto, é o movimento que defende a criação e a permanência do Estado Judeu na região da Palestina. Tão e somente isso. Os seus críticos acusam Herzl de ter tido posições racistas e puristas, de modo que o movimento sionista seria (ele todo) racista. Isso não tem fundamento, pois o movimento sionista (como demonstrado), desde sua origem foi multifacetado, com diferentes perspectivas sobre o mesmo assunto. Além disso, o sionismo não é um movimento contrário a outro povo, mas sim a favor do povo judeu, tão e somente. Árabes e muçulmanos israelenses vivem pacificamente e com os mesmos direitos políticos que os judeus em Israel (Leis Básicas de Israel, em especial a Dignidade Humana e Liberdade de 1992).

Se o movimento sionista fosse um movimento puramente racista, o Estado de Israel não teria surgido com uma ênfase humanista e inclusive socialista (os kibutz foram importantes políticas israelenses nas duas primeiras décadas do novo Estado). Os árabes muçulmanos israelenses não teriam hoje participação no Knesset (parlamento israelense) e não seriam juízes da Suprema Corte israelense. Os povos não poderiam votar e serem eleitos, não poderiam formar partidos e não poderiam sequer viver livremente nas cidades de Israel. É completamente infundado a acusação de racismo ou de apartheid por parte dos críticos do movimento sionista e de Israel. O objetivo histórico do sionismo é restabelecer o povo judeu na sua terra originária.

 

c). A criação do atual Estado de Israel e sua cronologia

 

Precisamos retornar ao final do século XIX e começo do século XX para compreender tanto o Movimento Sionista (acima já referido) quanto a situação da região da Palestina. O nacionalismo europeu contribuiu para que judeus vissem a necessidade de terem eles próprios a sua nação, em especial devido ao antissemitismo disseminado no velho continente. Casos como o caso Dreyfus (quando Alfred Dreyfus, um oficial judeu francês foi falsamente acusado de traição), o caso dos progroms na Rússia (violentos ataques contra a comunidade judaica na segunda metade do século XIX), o aumento do antissemitismo nas universidades alemãs e na mídia europeia (jornais, revistas etc.).

 

Quando na eclosão da primeira guerra mundial (1914-1918), um conflito entre o Império Britânico (e seus aliados, como França, EUA) contra o Eixo (formada por Alemanha, Império Austro-Húngaro e Império Otomano), a situação geopolítica tanto na Europa quanto no Oriente Médio se alteraram. Tanto o Império Britânico quanto Russo desenvolveram operações militares na região do Levante, incluindo o Sinai, Síria e a Palestina. Ao mesmo tempo, em 1917, o Império Britânico através da Declaração de Balfour declarou apoiar a formação de um lar nacional para o povo judeu.

 



 Com o fim da Primeira Guerra e o colapso do Império Otomano, os Britânicos assumiram o controle da Palestina (naquilo que ficou chamado como Mandato Britânico da Palestina, a partir de 1920, estabelecido pela Liga das Nações – antecessor da ONU). O Mandato Britânico da Palestina incluía a região que hoje é Israel, assim como da Transjordânia (mapa a seguir). Síria e Líbano ficaram sobre o controle francês. Esta partição do antigo Império Otomano se deu através dos Tratados de Sèvres (1920) e de Lausanne (1923).

 



Desde o final do século XIX, no entanto (ainda no Império Otomano), os judeus começaram o processo de imigração em massa para a região da Palestina. A primeira Aliá (como é chamado o processo do retorno judaico pós-diáspora) ocorreu entre os anos de 1881 e 1903, com judeus vindos do Iêmen, da Rússia e de outras partes da Europa Oriental para a Palestina (calcula-se em torno de 25 a 35 mil judeus). Entre os anos de 1904 a 1914, houve a Segunda Aliá, na qual judeus novamente vindos da Rússia e do Iêmen vieram em massa para a Palestina, e também polacos. Durante o Mandato Britânico da Palestina após a Primeira Guerra as Aliá se intensificaram, tornando-se ainda maior durante e após a Segunda Guerra Mundial (e do Holocausto).

 

Neste período, é importante compreender que nunca houve ‘expulsão’ de palestinos de suas casas ou terras, mas sim compras e negociações. Os conflitos que surgiram no período 1920 a 1948 na região da Palestina envolviam, muitas vezes, questões políticas e económicas. Os distúrbios de 1920 e 1921 foram ocasionados pelas tensões entre árabes contrários a imigração judaica. Em 1929, houve um massacre em Hebron aonde judeus e árabes morreram as centenas. Estes distúrbios contribuíram para que grupos judeus criassem forças paramilitares contrários ao Mandato Britânico e a estes atos violentos árabes (tais como o Irgun e os Lehi).

 

A situação original da convivência entre judeus e árabes a esta altura se dividia em três blocos: propriedades privadas judaicas, propriedades privadas árabes e propriedades públicas (controladas pelo Mandato Britânico e não pertencente nem a árabes ou a judeus). O mapa a seguir elucida isso. Em 1936, os árabes da Palestina resolvem se reunir politicamente através da Alta Comissão Árabe. Nela, estabeleceram que toda a região da Palestina pertencia aos árabes e reclamaram para si este direito, exigindo a expulsão dos judeus. Esse evento marca o precursor da ‘Causa Palestina’ e da negação da existência do Estado de Israel por parte do mundo árabe.

 



Em 1947, a ONU aprovou o plano de partilha da Palestina (mapa). Nela, se propunha a divisão da região da Palestina em dois estados. Um judaico, outro árabe e Jerusalém tornando-se a capital dos dois Estados (partilhada). Este evento fez com que os árabes se revoltassem ainda mais, conclamando a expulsão dos judeus e o estabelecimento de uma Palestina ‘apenas’ árabe e muçulmana. Este evento marcou a guerra civil árabe-israelense de 1947, o prelúdio da guerra de independência.

 

Em 1948, os Britânicos retiram suas forças da região, deixando a região num estado crescente de anarquia. Em 14 de Maio do mesmo ano, os judeus declaram a independência de Israel. Logo a seguir, países da Liga Árabe (Egito, Síria, Transjordânia – atual Jordânia -, Líbano e Iraque) invadem o recém-formado país judeu. Os israelenses lutaram sozinhos, tendo apoio de judeus do mundo todo como único apoio internacional. Motivados, coordenados e unificados, eles conseguiram vencer as forças desorganizadas dos árabes e, com isso, estabelecer finalmente o seu Estado judaico.

 

Parte II

Israel e Palestina: um conflito de negações e negociações

 

Desde 1948 e a formação do Estado judeu, Israel nunca mais teve paz concreta. Após a guerra de independência, tanto judeus quanto árabes sofreram com o deslocamento em massa de suas populações. Devido a conquista, as nações árabes ordenaram que os palestinos que viviam em território israelense se retirassem da região, do mesmo modo que muitos judeus foram expulsos dos países árabes. Esta situação ficou conhecida como ‘Nakba’, aonde muitos palestinos foram ou para outros países árabes, ou se refugiaram na Cisjordânia ou em Gaza.

 

A situação continuou tensa ao longo das décadas subsequentes, com destaque para a Guerra de Suez (1956), Guerra dos Seis Dias (1967) e a Guerra do Yom Kippur (1973). Após a Guerra dos Seis Dias, quando Israel foi hostilizado pelo Egito e Síria e tiveram de, mais uma vez, lançar mão de uma guerra defensiva, a situação geopolítica de Israel mudou. Conquistando o Sinai no Egito e as Colinas de Golã na Síria, o status de Israel passou ao de potência regional. A partir daí os conflitos subsequentes deixaram de serem entre estados árabes e Israel e tornaram-se guerras de guerrilha (e terrorista).

 

Também durante a Guerra dos Seis Dias, Israel conquistou parte da Cisjordânia, Faixa de Gaza e Jerusalém Oriental. A atual situação destas regiões é originária destas conquistas. Desde então, colonos israelenses tem estabelecidos colonias na Cisjordânia, aumentando a presença dos mesmos na região. A criação da Organização para a Libertação da Palestina (OLP), por Yasser Arafat (fundador do Fatah, partido originário da Cisjordânia) marcou a nova relação entre Israel e a Palestina, com o Hamas surgindo nos anos 1980 na Faixa de Gaza.

 

Entre os diversos tratados e conversações entre as partes, destaquei a seguir os eventos mais importantes para compreender como chegamos ao estado de coisas atualmente.

 

Contexto: ocupação israelense de Gaza e Cisjordânia pós Guerra dos Seis Dias (1967), além da ocupação israelense do Sinai (Egito), Colinas de Golã (Síria) e Jerusalém Oriental (Cisjordânia).

 

I.                    Acordos de Camp David (1978);


Nestes acordos, mediados pelos EUA no mandato de Jimmy Carter, Israel e Egito normalizaram suas relações diplomáticas. Israel devolveu o Sinai para o Egito, em troca do reconhecimento de sua existência por parte do país árabe e da aproximação entre ambos os estados. Embaixadores foram trocados, acordos comerciais foram estabelecidos e a relação Israel-Egito tornou-se não mais conflituosa.

 



 II.                  Guerra do Líbano e Acordo de Retirada (1982);


Em 1982, Israel invadiu o Líbano com o objetivo de retirar a liderança Palestina que estava alojada na capital do país, Beirute. Este ataque, que marcou a guerra entre Líbano e Israel, levou a um tratado na qual a OLP (Organização para a Libertação da Palestina) deixaria o país. Neste conflito, surgiu o Hezbollah, grupo terrorista financiado pelo Irã e contrário a existência de Israel.

 

III.                Declaração de Autonomia Palestina (1988):


Em 1988, o Conselho Nacional Palestino (CNP) proclamou a independência do Estado da Palestina em partes da Cisjordânia e da Faixa de Gaza, e a OLP reconheceu a Resolução 242 do Conselho de Segurança da ONU (que versava sobre a retirada de Israel das regiões ocupadas e pela integridade dos territórios palestinos da Partilha) e a Resolução 181 da Assembleia Geral da ONU (sobre a repartição da Palestina proposta em 1947). Essa ação abriu caminho para negociações subsequentes.

 

Entre os anos 1988 e 1993 houve a Primeira Intifada (movimento revolucionário palestino), quando os Palestinos se revoltaram contra a ocupação Israelense de Gaza e Cisjordânia. Este evento permitiu as futuras negociações de Paz no que ficaram conhecidos como Acordos de Oslo.

 

IV.                Acordos de Oslo (1993 e 1995);

 



 Estes acordos foram uma série de negociações entre Israel e a Palestina, mediados pelos EUA sob o comando de Bill Clinton, na cidade de Oslo, na Noruega. Este acordo previa os seguintes pontos:

 

a). A retirada das forças israelenses da Faixa de Gaza e da Cisjordânia, assim como a garantia do autogoverno por parte da Autoridade Palestina.

b). O autogoverno seria dividido da seguinte forma:

 

- Área A: Controle total pela autoridade palestina

- Área B: Controle civil pela autoridade palestina e militar pelo Estado de Israel

- Área C: Controle total pelo Estado de Israel

 



c). O reconhecimento mútuo, por parte de Israel e da Palestina, das autoridades de ambos os estados e governos, como estabelecido em tratados anteriores pela ONU e reconhecidas internacionalmente.

 

Tais acordos, contudo, não foram contemplados na sua totalidade por diferentes fatores. Um deles foi a mudança de postura das lideranças políticas na Palestina, em especial na forma conservadora com que certas alas do estado palestino viam os acordos. Em resposta a este fracasso, houve a Segunda Intifada (2000-2005), desta vez muito mais violenta do que a primeira. Como consequência da Segunda Intifada e da guerra civil na Palestina (entre Fatah e Hamas), Israel saiu unilateralmente de Gaza e manteve os assentamentos na Cisjordânia.

 

Com o Hamas tendo assumido o poder total de Gaza a partir de 2007 e a Fatah governando as regiões autónomas da Cisjordânia, este ficou o status quo até recentemente. A partir de 2020 começam as negociações que ficaram conhecidas como Acordos de Abraão e que poderiam mudar este cenário.

 

V.                  Acordos de Abraão (2020-2023);


Mediados pelos EUA a partir da administração Trump (2020), os acordos de Abraão visavam a normalização da relação entre Israel e os estados árabes. Nesta normalização, abria-se espaço para a questão Palestina, ratificando os acordos de Oslo e alterando a realidade da ocupação israelense da Cisjordânia. Tais acordos foram firmados, primeiro, entre os Emirados Árabes Unidos e Israel, e posteriormente por Sudão, Marrocos, Omã, Bahrein e Jordânia com Israel. Em 2023, a administração Biden estava muito perto de conseguir que a Arábia Saudita (de tradição sunita e árabe, assim como os Palestinos), assinassem também o acordo de Abraão. Deste modo, seria mais uma grande nação árabe a reconhecer Israel e seu direito de existir, assim como, em trocar embaixadores.

 


No mapa acima, em verde estão as nações envolvidas nos Acordos de Abraão e em vermelho estão os estados e grupos terroristas hostis a Israel (Irã, sendo o principal financiador do Hamas em Gaza e do Hezbollah no Líbano, assim como dos Hutis no Iêmen). Oficialmente, os governos do Líbano, Síria e Iraque não possuem posição formalmente beligerante ou amistosa com Israel, estando estes engolfados nas suas próprias pelejas internas.



Acima está o mapa atual de Israel com a situação oficial tanto de Gaza (dominada pelo Hamas) quanto da Cisjordânia (governada em partes pelo Fatah) antes dos ataques de 7 de Outubro de 2023.

 Observe que, na fronteira com a Síria, ainda estão as Colinas de Golã sobre controle israelense, desde o cessar-fogo pós 1967 e 1982.

   

  Parte III

Os ataques do Hamas e o conflito atual: verdade e narrativa

 

No dia 7 de Outubro de 2023, o Hamas (grupo terrorista que controlava Gaza desde 2007), lançou um ataque feroz contra o sul de Israel. O objetivo não eram instalações militares, mas sim, civis. Foi inteiramente um ataque hediondo contra a sociedade civil israelense. Como este ataque aconteceu a despeito das medidas de segurança de Israel, ainda está sob debate e escrutínio. No entanto, é seguro afirmar que foi um ataque planejado por meses a fio e com financiamento internacional (no caso, do Irã). Geopoliticamente falando, o objetivo dos ataques eram o de impedir que Israel fechasse o acordo com a Arábia Saudita, visto que isso seria uma pedra no sapato do Irã (adversário histórico dos Sauditas). 

 


  

Rapidamente as Forças de Defesa de Israel (IDF na sigla em inglês) readquiriram controle dos territórios e impuseram um cerco a Gaza. Desde então estão sendo criticados por algumas entidades internacionais. Nesta parte do artigo, pretendo apresentar uma cronologia de eventos, suas consequências, e também o respaldo pela lei internacional tendo por base a verdade (e não a narrativa veiculada pela imprensa sem comprovação factual).

 

Disclaimer: todo flagelo contra civis não-beligerantes é uma tragédia, especialmente aquelas que afligem crianças, idosos e pessoas inocentes. É dever de toda a comunidade internacional e esclarecida condenar, seja por parte da Palestina ou de Israel, abusos contra os direitos humanos.

 

Vamos aos fatos:

 

1.    Em 2005, Israel saiu unilateralmente de Gaza, permitindo que os palestinos se autogovernassem na região.

2.    Em 2007, depois de um conflito local entre a Fatah e o Hamas, o grupo Hamas tomou o poder na Faixa de Gaza, criando riscos diretos à segurança de Israel.

3.  Desde então e por conta desta tomada de poder, Israel criou um bloqueio marítimo, aéreo e terrestre para impedir que o Hamas fizesse ataques ao país.

4.     Devido a este bloqueio, Israel ficou responsável pelo fornecimento de mercadorias alimentares e de subsistência aos habitantes da Faixa de Gaza.

5.  Por conta deste contexto, a ONU e demais instituições internacionais tem feito esforços humanitários, buscando diminuir a escassez do povo palestino em Gaza.

6.     Estas ajudas humanitárias, contudo, não tem contemplado os palestinos de Gaza, visto que há abundantes denúncias internacionais do uso indevido destas ajudas pelos membros do Hamas.

 

O Hamas, historicamente, nunca reconheceu o Estado de Israel e mantém uma atitude beligerante diante do país desde sempre. O Hamas aceita apenas negociar nos seus termos, isto é: o fim do Estado de Israel e a entrega de todos os territórios do país para a Palestina. Nada mais e nada menos. Postura oposta ao da Fatah, que desde 1988 reconhece Israel e defende a solução de dois estados (em acordo com a proposta de Partilha de 1947, ou a Resolução 181 da Assembleia Geral da ONU).

 

Ao declarar guerra ao Hamas, Israel deixou claro que seu inimigo não é o povo palestino, mas sim, o grupo terrorista que quer um genocídio judeu. O Hamas não é ‘resistência’ armada dos palestinos, não são defensores do povo palestino e tampouco estão preocupados com fazer a paz. Tudo o que o Hamas quer efetivamente é acabar com Israel, dominar toda a região e implementar um governo radical islâmico a exemplo do Califado do ISIS. Portanto, vamos entender o contexto.

 

O Hamas controla uma área urbana composta por 2 milhões e 200 mil palestinos. Dentro deste território, eles se escondem em redes de túneis por baixo de Gaza que perpassa hospitais, escolas, residências e ruas. O Hamas roubou ajudas humanitárias enviadas pela ONU para o povo palestino de Gaza, e ainda recebeu financiamento e apoio logístico por parte do Irã e de seus líderes que vivem no Catar (Mousa Abu Marzook, por exemplo, é um dos líderes sénior do Hamas, bilionário e que vive no Catar, longe da pobreza que o seu povo vive).

 

Israel, logo após os ataques de 7 de Outubro, cercou Gaza precisamente para impedir novos ataques por parte do Hamas. Desde o dia 7 Israel sofre ataques vindos do Hamas, desde foguetes até ameaças com relação aos reféns israelenses que ainda estão sob o controle do Hamas. Nenhuma agência internacional de inteligência é capaz de destruir o Hamas sem com isso bombardear e atacar aonde o Hamas opera. E é aqui que entra a questão que tem sido fruto de controvérsia nos últimos tempos.

 

Para explicar o que Israel está fazendo e o que respalda as Forças de Defesa de Israel nas suas operações, é preciso que o leitor entenda o básico do direito internacional e dos tratados aceitos multilateralmente pelos diversos estados-nação e atores não nacionais.

 

O direito de Israel se defender

 

De acordo com a Carta das Nações Unidas, em seu Artigo 51, ‘nada na presente Carta prejudicará o direito inerente de legítima defesa individual ou coletiva no caso de ocorrer um ataque armado contra um Membro das Nações Unidas, até que o Conselho de Segurança tenha tomado as medidas necessárias para a manutenção da paz e da segurança internacionais’.

 

Ou seja, nenhum artigo da Carta das Nações Unidas é contrário ao direito de Israel se autodefender contra o Hamas e de fazer a guerra contra o agressor, de modo a preservar a segurança de seus cidadãos e também salvaguardar a paz em seu território. A partir disso, temos que a guerra entre Israel e Hamas é justa e dentro do que estabelece o direito internacional. Agora, a questão é: como essa guerra deve ser combatida? Se o Hamas é conhecido por usar os palestinos como escudos humanos, se os túneis do Hamas estão espalhados por debaixo de prédios civis e não-militares, como Israel pode combater este tipo de adversário?


Lembrando que Israel precisa seguir o Direito Internacional, já o Hamas (por ser um grupo terrorista e que age à margem do direito), não precisa.

 

Primeiro, temos de lembrar que o Direito Internacional Humanitário é claro na defesa dos civis e na distinção entre partes beligerantes e partes não-beligerantes. Contudo, há exceções para isso. Para compreender, temos de ir à Convenção de Genebra (e seus Protocolos Adicionais) e ao Estatuto de Roma.

 

No Protocolo Adicional I à Convenção de Genebra (1977), em seu artigo 13, temos que ‘a protecção devida às unidades sanitárias civis apenas poderá cessar se aquelas forem utilizadas para cometer, fora do seu objectivo humanitário, actos nocivos ao inimigo. No entanto, a protecção cessará somente quando uma notificação, fixando, sempre que a tal houver lugar, um prazo razoável, ficar sem efeito.’.

 

No dia 10 de Outubro de 2023, Israel avisou a todos os habitantes do norte da Faixa de Gaza a se dirigirem para o sul, pois aquela região seria lugar de conflito entre as Forças de Defesa de Israel e o Hamas. O grupo terrorista, ao invés de permitir que seu povo fosse para o Sul como solicitado por Israel, os proibiu de sair de suas casas e da região de conflito, numa clara tentativa de – mais uma vez – usar os palestinos como escudo. Os bombardeios israelenses tiveram, sempre, o foco de atingir unidades militares do Hamas (diretas ou a partir de construções civis).

 



Quando o Hamas utiliza estruturas civis para sua própria proteção, eles incorrem em crime de guerra, exposto no Protocolo no parágrafo 4 do Artigo 12:

 

4 - As unidades sanitárias não deverão em qualquer circunstância ser utilizadas para tentar colocar objectivos militares ao abrigo de ataques. Sempre que possível, as Partes no conflito procurarão situar as unidades sanitárias de maneira que os ataques contra objectivos militares não ponham aquelas em perigo.

 

A fronteira sul de Gaza não é controlada por Israel, mas sim, pelo Egito. Mais precisamente no ‘Ponto de Passagem de Rafah’, cidade do sul de Gaza. É ali aonde os refugiados do atual conflito estão amontoados e também por ali que os caminhões de ajuda humanitária passam, do Egito para Gaza. Se os refugiados de guerra ou as ajudas humanitárias não chegam a Gaza a partir desta fronteira, o responsável é o governo do Egito (não de Israel).

 

Respeitando o direito internacional, Israel criou um corredor humanitário para o Sul de Gaza e alertou com antecedência que todo civil no meio do fronte deve sair da linha de tiro, uma vez que há um conflito em andamento entre o Hamas e as forças israelenses. Os Estatutos de Roma corroboram o direito de Israel atacar unidades sanitárias ou civis, desde que estes estejam sendo utilizados pelo inimigo como meio de causar danos ao adversário.

 

Apenas é considerado crime de guerra os ataques perpetrados por um estado beligerante com o único e exclusivo objetivo de causar danos a população civil não-beligerante no conflito. Isto é, atacar civis que não estão envolvidos de nenhum modo com o inimigo no combate. Fora isso, em acordo com o Protocolo, se a estrutura ou unidade civil é usada para causar danos ao adversário, ele se torna um alvo legítimo.

 

Aqui, é importante que dois princípios sejam observados:


1º. O princípio da distinção (entre civis e militares);

2º. O princípio da proporcionalidade;

 

Neste momento, o que temos são os eventos denunciados e o conflito aberto entre Israel e Hamas. Para averiguar concretamente se houve ou não crime de guerra perpetrado por Israel, teremos de ir caso a caso, com fatos bem documentados e independentes, para confirmar se de fato havia intenção, se havia causalidade inadvertida e se os dois princípios acima foram ou não respeitados. Israel, contudo, tem afirmado sistematicamente e promovidas evidências de que estão agindo em conformidade com o direito internacional, justificando seus alvos e ataques.

 

Já da parte do Hamas, não há dúvidas de que houveram crimes de guerra declarados. Os terroristas não apenas sequestraram, mas também mataram de forma hedionda civis (crianças, bebês, mulheres, idosos, homens) em vilas, em um concerto de música, em cidades pacíficas e não-militares. O fizeram com uma GoPro em seus corpos, filmando tudo e registrando os atos de maneira vil e premeditada. Isso é um crime de guerra indefensável e incalculável que deveria ser levado ao Tribunal Penal Internacional.


Conclusão


Não existem dois lados iguais neste conflito.

 

Não conseguiria em um artigo online versar sobre todos os pormenores deste conflito, desde sua história até os eventos mais recentes. O que busquei aqui foi dar ao leitor uma qualitativa oportunidade de ver os fatos a partir de uma perspectiva mais realista e mais austera. As coisas são o que são, e elas independem das narrativas. O argumento de que ‘Israel não deveria existir’ é antissemita, pois não condiz com a realidade histórica dos fatos. O argumento de que Israel é um Estado terrorista também é antissemita, pois não condiz com a estrutura mesma do Estado de Israel. E mais grave ainda, ir para as ruas ou militar na Internet, de modo a direta ou indiretamente reforçar o argumento do Hamas, é tão vil quanto os próprios ataques do dia 7 de Outubro.

 

O Mandato Britânico da Palestina gerou um estado árabe chamado Jordânia, e um judeu chamado Israel. A ideia de um Estado da Palestina surge em meados de 1930 em resposta a imigração judaica na região e por conflitos políticos de domínio da terra, não por uma questão colonialista como alguns detratores tentam fazer parecer. Judeus e árabes negociaram a compra e venda de terras entre si, não houve uma imposição militar. Os conflitos militares começam a surgir durante o Mandato Britânico por conta do controle britânico das terras públicas.

 

Palestinos que ficaram em Israel depois da independência, se tornaram israelenses árabes e muçulmanos. E lá vivem com seus direitos preservados. Toda a tragédia que acomete o povo palestino, tanto em Gaza quanto na Cisjordânia, se deve a conflitos perpetrados pelo mundo árabe contra a presença judaica na região. Isso tem de ser dito, pois ao contrário do que os marxistas internacionalistas tentam fazer parecer, Israel não é uma força ‘colonialista’ europeia na região. Pelo contrário, os judeus foram abandonados a própria sorte em 1948 com a saída unilateral dos Britânicos. Nos primeiros anos da Guerra Fria, Israel teve apoio da União Soviética. Depois, começou a ter apoio norte-americano (e por interesse geopolítico deste, não de Israel).


Não há dois lados 'iguais' neste conflito. Israel ainda é um estado plural, ocidentalizado e respeitador dos direitos humanos. Sempre o foi. Já o Hamas não, são apenas terroristas. Israel tem feito grande esforço pela paz, pela solução de dois estados. O mundo árabe começou finalmente a caminhar nesta direção. É nosso dever, como liberais, como humanistas, não permitir que os ataques do Hamas faça com que este esforço coletivo caia por terra. 

 

Israel veio para ficar. E enquanto uma boa parte do mundo Ocidental (em específico as esquerdas) e oriental (os muçulmanos e árabes radicais) não aceitarem este fato, iremos continuar a assistir mais sofrimento, mais guerra e mais destruição.

 

Se a sua pergunta é ‘até quando’? A resposta é simples: até onde tiver de ser.

 

Obrigado pela leitura!

08 de Novembro de 2023


Sasha van Lammeren

Jornalista

Mestre em Comunicação Política

Doutorando em Ciência Política

 


BIBLIOGAFIA

 

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