25/10/2018

BRAZIL - O Fim do Brasil com S


BRAZIL
O Fim do Brasil com S


Tenho escrito sistematicamente a cerca do Brasil desde, pelo menos, 2013. Naquele ano, quando houveram as manifestações (ou marchas) de Junho-Julho, parecia que o povo brasileiro havia se levantado (espontaneamente) contra tudo de ruim que existia no país. Foi como um grande grito de “chega”, dado para o mundo nos ouvir. Era a véspera da Copa do Mundo de 2014 e das eleições presidenciais do mesmo ano.

A partir dali, no entanto, a população brasileira começou a ser engrupida numa escalada voraz e virulenta de anti-petismo, alimentada pela grande mídia e por setores conservadores da sociedade. Anti-petismo esse que ganhou ares de anti-esquerdismo, como se a culpa do Brasil estar como está fosse toda da esquerda. Mais ainda, levantou-se um discurso neoconservador e fascista que estava adormecido no interior de muitos brasileiros.

Isso significa que a insatisfação de 2013, que era popular e espontânea, foi aparelhada pela direita (nacional e internacional), visando com isso construir um caminho de poder alternativo ao que, até então, o país caminhava na sua jovem democracia. Pode-se questionar se 2013 foi apenas isso, ou se estes movimentos já existiam incipientes desde antes. Para isso teríamos de fazer uma rememoração profunda da história brasileira.

Neste texto, contudo, vou me ater a um fato consumado e muito claro nas eleições de 2018: a morte do Brasil. Mas, como podemos identificar a morte de um país? Primeiro, temos de entender o que compõe um país.



Observe o quadro conceitual acima. Para formar um Estado-Nação, precisamos dos elementos povo, cultura, território e governo. Deste modo, teremos um “Estado-Nação”. Quando falamos da morte de um país, estamos nos referindo necessariamente a rutura destes elementos formadores do Estado-Nação. Resta perguntar: em 2018, como que as eleições demonstram claramente que o Brasil caminha para sua morte certa?

Primeiro, temos de compreender o povo. O povo brasileiro sempre foi politicamente apático e passivo diante do poder. Eram poucos os reclames populistas que surgiam com força suficiente para levantar as massas (varguismo, brizolismo, lulismo). Nas eleições de 2018, no entanto, ficou claro que o lulopetismo e o anti-petismo são duas forças coesas o suficiente para dividir a população ideologicamente e levantar as massas.

Poderíamos falar o que levou o povo a cair nesta rede populista de direita e esquerda, o que nos demandaria um outro texto ainda mais longo. Em todo caso, há um fato aqui e ele não pode ser negado: o lulopetismo e o anti-petismo. Portanto, o povo até então sólido e unitário (divergente apenas em questões secundárias), agora possui uma fratura social extremamente considerável, tanto a nível de discursos quanto a nível de atitude. O anti-petismo foi completamente sequestrado pelo Bolsonarismo e o lulopetismo sequestrou a narrativa da Democracia.

Se o lulopetismo e anti-petismo eram dois discursos mais focados em pequenos grupos radicais até meados de 2017, depois das eleições de 2018 tornaram-se dois grandes grupos populacionais, que ou são anti-petistas radicais ou são anti-bolsonaristas radicais. Não há espaço, aqui, para o meio-termo. A questão é que se isso fosse um problema apenas de povo, ou seja, se fosse uma divisão política de momento, haveria chance de a cultura sanar as discórdias no longo prazo. Mas aqui entra outro elemento da questão: a guerra cultural.

A cultura brasileira sempre viveu sobre uma falsa paz e tolerância. No entanto, o fundamentalismo evangélico e o movimento neoconservador recente fizeram brotar entre a população uma radical divisão entre o Brasil nativo-africano e o Brasil eurocêntrico. Chamamos de Brasil nativo-africano o grupo social formado por influências africanas e indígenas. E o grupo Brasil eurocêntrico formado por influências judaico-cristãs (especialmente as neopentecostais que querem, a todo custo, refundar uma espécie de “neo-messianismo” religioso, como o fundamentalismo norte-americano).





Num país como o Brasil, isso traz a tona a questão do “Brasil verdadeiro”, de modo que ambos os lados reclamam para si a alcunha de ser o “verdadeiro” Brasil. Neste sentido, temos muito claramente um povo com duas visões de país, tanto a nível político, quanto a nível religioso e cultural. São dois Brasis que não se sustentam e não convivem pacificamente. O Brasil de cultura pagã ou nativo-africano, e o Brasil conservador e fundamentalista cristão. Se antes havia uma tolerância tácita entre ambos, hoje está sendo posto para fora todos os preconceitos enraizados no indivíduo. Preconceitos estes que, graças a guerra contra o politicamente correto, se tornou uma bandeira política e social.

E isso nos leva para a questão do território. Neste momento (Outubro 2018), ainda não há uma radical polarização territorial capaz de dividir geograficamente o Brasil. No entanto, o processo social-político e cultural já está acontecendo e não há qualquer horizonte (quer seja num Governo Bolsonaro ou num Governo Haddad) onde tal polarização diminua ou arrefeça. Pelo contrário, as questões económicas, sociais e geopolíticas parecem tender a um acirramento das tensões, de modo que a polarização será uma narrativa guarda-chuva para todo tipo de atrocidade e depredação do tecido social.

Não é de se ignorar a tendência do Nordeste (e partes do Norte) brasileiro favorecer o PT e as culturas nativo-africanas, ao passo que sul-sudeste favorecem o anti-petismo e a cultura judaico-cristã eurocêntrica. O centro-oeste tende a favorecer o sul-sudeste, embora com menos impacto e importância política. O grande Brasil acontece mesmo no eixo litorâneo que vai dos Pampas gaúchos até a Caatinga nordestina. E é este Brasil que está polarizado e em conflito constante.


Em vermelho, votos dados a Haddad no primeiro turno. Em verde, votos dados a Bolsonaro.

Até aqui falamos dos elementos formadores da “Nação”. Agora, iremos observar o conjunto Estado-Nação para compreender o argumento central do texto. Um Estado é um Governo que administra um território. Instituições de Estado são permanentes e instituições de Governo são transitórios. Está claro desde 2015-16, no impeachment ou golpe parlamentar de Dilma Rousseff que as instituições republicanas estão aparelhadas.

Não pelo petismo, como se havia cogitado, mas pela corrupção e pelos interesses de diversos grupos que coexistem no mesmo espaço. Isso significa que as instituições brasileiras não agem mais por respeito a lei ou ao devido processo legal, mas sim por ativismo jurídico e movidos por forças de interesse político-ideológico. Oras, se são as instituições de Estado que sustentam o próprio Estado, e se ela não tem conseguido se manter impassível diante do caos social, então notadamente elas também estão inseridas no contexto polarizador.

As Forças Armadas são um exemplo disso. Há setores legalistas (representado pelo Comandante do Exército, General Villas Boas) e há setores linha-dura (representado pelo General Mourão), que defendem com unhas e dentes a candidatura Jair Bolsonaro e uma “releitura” do regime militar. A Lei da Anistia, que havia anistiado todos os crimes daquele período (tanto os cometidos por militares quanto por guerrilheiros de esquerda), deixou na história brasileira uma ferida exposta que, agora, parece cobrar seu preço. O Supremo Tribunal Federal, maior instância jurídica do país, assim como o STJ, a OAB e demais instituições fundamentais da sociedade civil e do Estado de Direito estão aparelhados. Isso significa que é muito diminuta a possibilidade de, nos próximos anos, estas instituições serem reformadas para agir de modo imparcial e como lhe é devido.

O Governo Bolsonaro tenderá a criar crises institucionais diversas vezes, seja com o Congresso (que será composto por elementos da esquerda e do centro fisiológico), seja com tribunais que, por ventura e quando provocados pela sociedade civil, tomem atitudes contrárias aos interesses do Governo. Portanto, o cenário de ingovernabilidade e tendência ao autoritarismo está dado. Não é uma teoria da conspiração, não é uma possibilidade e nem mesmo uma hipótese, mas trata-se necessariamente de um dado factual da realidade presente. Já bem visível durante a própria campanha do segundo turno.

Ou seja, o Estado-Nação brasileiro não tem mais condições de continuar funcionando. Espera-se de qualquer país um mínimo de coesão a cerca de princípios e fatos compartilhados por todos, quer seja à direita quer seja à esquerda. Neste momento, temos um grande movimento revisionista histórico de ambos os lados, radicalização cultural, social e política e uma economia que demanda sacrifícios da parte de toda a população para voltar a funcionar a contento. Se a situação atual já é das piores possíveis, com a tendência da economia falir, o desemprego aumentar, a inflação aumentar e a moeda derreter, não há qualquer chance de uma recuperação da saúde do Brasil e seu povo.

E ainda que a economia consiga sobreviver por algum milagre, o estrago cultural e social já está feito. Trata-se de uma guerra por hegemonia no Brasil. Dois tipos de Brasis estão em conflito. E nenhum dos dois Brasis quer negociar ou compreender o outro lado. Quando não há mais diálogo, sobra a guerra. Ou seja, além do país estar a beira de uma guerra civil (como a espanhola), estamos nos encaminhando para o fim concreto do Brasil. Pois depois desta guerra, sobrará apenas ressentimento, culpa, tristeza, remorso, arrogância e ego. Todos os fatores mais humanos de brigas identitárias. O futuro do Brasil com S é a divisão territorial e a fundação de dois diferentes Brasis.

É por isso que, após o dia 28 de Outubro, findado as eleições, chamarei o que sobrou do meu país de “Brazil” com Z. Quando se traduz o Brasil para o inglês, usa-se o Z, de modo a facilitar a fonética para os estrangeiros. Pois bem, quando a desgraça estiver feita, apenas me dirigirei ao Brasil com o título de “Brazil” com Z. Pois o Brasil unificado, culturalmente diverso, tolerante, democrático e próspero terá morrido e não será ressuscitado. Não importa o que aconteça no futuro, seja com uma sociedade inteiramente neoconservadora, uma sociedade socialista, ou um território dividido, o fato é que o Brasil morreu e não tem chances de se recuperar nunca mais. Triste fim para um ex-Império que surgiu entre as nações prometendo ser o celeiro do mundo, a pátria do evangelho e o país do futuro.

Que D. Pedro I e II, que a Princesa Isabel, que Joaquim Nabuco, José Bonifácio, Ruy Barbosa, Machado de Assis e tantos outros pais da pátria, nos mais diferentes rincões do país e com os diferentes tipos de pensamento nos perdoem. A minha geração perdeu o Brasil para sempre. E agora restará ao futuro recolher os espólios e cada lado viver como lhes melhor aprouver. Não se trata de uma previsão apocalíptica, mas de uma simples constatação enfática de um presente caótico e um futuro dantesco. 

Em todo caso, aos guerreiros que sobram, aos poucos brasileiros que ainda restam e estão dispostos a lutar por este país, que se levantem! Pois ou é INDEPENDÊNCIA, OU É MORTE! Não tem como fugir. Nunca o título deste blogue foi tão importante e necessário.





Obrigado pela leitura,

Sasha Lamounier
Um Liberal Clássico e Patriota brasileiro

25 De Outubro de 2018
Porto, Portugal