11/11/2015

A Liberdade



A LIBERDADE

Por

Sasha Lamounier



Introdução

Liberdade é aquela palavra que todo mundo fala, conhece, mas poucos realmente sabem o que significa. Para contribuir na busca pela definição de liberdade, escrevi o presente texto, cujo intuito é apenas facilitar o entendimento e incluir novos dados neste que tem sido um dos mais intensos debates de sempre. 


Há muitas formas de entendermos a liberdade. Nomeadamente, costumamos estuda-la pelo prisma da liberdade humana. Pela análise puramente técnica e política, liberdade pode ser tanto ausência de coerção, como a autonomia máxima do indivíduo. Há, porém, alguns que afirmam que a liberdade não é sequer um princípio. Enquanto outros dizem que ela não pode existir sem, antes, a igualdade material. Os liberais afirmam que a liberdade é um direito natural, portanto, parte integrante de outros dois princípios, tais como vida e propriedade. Esta visão do direito natural constitui o direito negativo, onde ninguém pode tirar de você aquilo que já é seu. Deste, surge o direito positivo e a liberdade pela lei, onde você não pode fazer nada que interfira nos direitos alheios, sob pena de ser punido se fazê-lo.

De forma resumida, o debate a cerca da liberdade enquanto princípio político e normativo ronda estas estruturas acima citadas. Mas há também o debate filosófico. Aristóteles, por exemplo, definia a liberdade como “o princípio da ação e inação”. Para Descartes, a liberdade é exercida por quem compreende as alternativas para a escolha. Para Spinoza, ser livre significa agir de acordo com sua natureza. Para Schopenhauer, a liberdade humana não existe, estando a vontade do homem condicionada à representação da realidade que ele apreende na experiência com o fenômeno. Já para Sartre, não há determinismo. A liberdade é, segundo ele, o indeterminismo absoluto.

Muitos outros pensadores definiram a liberdade de acordo com seus trabalhos filosóficos (Hobbes, Locke, Hegel, Marx, Mill, Hayek etc.). Como não é possível num curto espaço de tempo fazer um estado da arte amplo demais, farei a seguir uma síntese elementar a cerca destas filosofias da liberdade.  

Podemos afirmar que a liberdade possui relação com a ausência de dominação. Ou ainda, com a ausência de impeditivos ou restrições para a vontade natural. Ela também possui relação direta com abertura, com a maximização de possibilidades. Sintetizando os principais pensadores a cerca da liberdade, pode-se concluir com segurança que a liberdade é a capacidade de agir sem qualquer tipo de condições para esta ação. Ou, havendo impeditivos naturais ou de outra ordem (lei), a liberdade seria a pura força que move o ser em direção à ruptura destas restrições. Mais objetivamente falando, liberdade é ausência de restrição e, ao mesmo tempo, autonomia de ação. Em suma, liberdade é o desejo de expansão da expressão humana.


Vídeo 1 - Complemento de Análise Geral


Feito este rápido apanhado de compreensões, para contribuir neste debate, fiz uma análise do conceito de liberdade utilizando as quatro causas aristotélicas para definir o que é liberdade. Eis a análise:


I.                   Causa formal;

Qual é a causa formal da liberdade? Ou seja, qual é a essência do conceito de liberdade? Podemos dizer que a essência, a base fundamental, estrutural da liberdade é a potencialidade. Se não há restrições e se ao mesmo tempo há autonomia, pode-se dizer que como essência a liberdade significa potencialidade. Ou seja, a causa formal da liberdade é a potência em si.

II.                Causa material;

Em que matéria consiste o objeto “liberdade”? Um copo de vidro consiste num objeto de vidro em forma cilíndrica. E a liberdade? Qual é sua matéria? Qual é o corpo material da liberdade por si mesma? É possível ver a matéria da liberdade como puro objeto observável? Evidentemente não podemos responder a isso. A liberdade sempre será relacionada a algo ou alguma coisa. De outro modo, a liberdade precisaria ser observada através de todos os elementos da existência. A liberdade de tudo simplesmente não existe (é uma contradição), pois se considerarmos tudo uma única coisa, nela não há restrição e, ao mesmo tempo, há plena autonomia (o Tudo se resume a si mesmo). O todo seria a resposta para a liberdade plena. E sua matéria seria qualquer coisa que existe no cosmos. Não sendo este o objeto possível de estudo para o ser humano, precisamos identificar outros elementos materiais da liberdade. Portanto, das coisas.

Evidentemente que se falássemos da liberdade de um gato, a matéria será aquilo que ele pode fazer com seu corpo de gato. Quando falamos da liberdade do ser humano, estamos nos referindo a tudo aquilo que o homem pode fazer utilizando seu veículo físico de expressão: o corpo. Neste sentido, a causa material da liberdade humana é o corpo humano. É como o indivíduo se expressa neste mundo físico-biológico. Ainda que houvesse outros mundos onde o espírito humano se apresenta, não seria objeto de nossa análise, visto que o problema central da nossa investigação tem sido tudo aquilo concernente à liberdade do homem e não do espírito. Portanto, a causa material da liberdade humana é o corpo humano.

III.             Causa eficiente;

A causa eficiente está relacionada à origem do objeto. Aquilo que torna possível sua existência. Neste sentido, qual é a origem da liberdade? Como refletido na causa material, só podemos investigar a liberdade das coisas. Neste sentido, qual é a causa eficiente da liberdade humana? O que deu origem a liberdade humana?

Se considerarmos a liberdade humana a não restrição, então é nosso conhecimento sobre as coisas que nos dissolve das restrições que possivelmente tenhamos. Se a liberdade humana é a autonomia, então igualmente é nosso conhecimento que nos garante capacidade de agir dentro de uma série de eventos externos e internos ao corpo humano.

Neste sentido, a origem da liberdade é a mesma origem de nossa causa material. E qual é a origem do corpo humano? Sem entrar numa longa discussão biológica e genética, podemos afirmar com certeza que a origem do corpo humano é o planeta onde nascemos. Afinal, todos os minerais, gases, líquidos e nutrientes que compõem nosso corpo biológico derivam dos objetos que fazem parte do Planeta Terra e mesmo do Universo solar conhecido. Mas seria essa a origem da liberdade? De certo que da liberdade humana, sim. Mesmo que consideremos uma criação alternativa para nosso corpo, ainda assim teríamos de aceitar o fato de que nunca houve um exemplo em contrário demonstrando que um corpo humano pode nascer e sobreviver em outro planeta que não a Terra. Neste sentido, devemos a origem da liberdade humana ao Planeta onde vivemos e nascemos, pois somente neste planeta e seus objetos é possível à manutenção do corpo que nos dá forma.

IV.             Causa final;

Por fim, qual é a razão de algo existir? Qual é a finalidade da existência da liberdade? Por que o ser humano busca o fim das restrições ou a plena autonomia? Para responder tais questões, precisamos relembrar as três últimas causas.

Primeiro, a liberdade como forma é potencialidade. O fim da restrição e a plena autonomia nos leva, diretamente, para a potência. Esta potência é traduzida em capacidade de pensar e agir do modo como aprouver à vontade do indivíduo, dotado de plena independência.

A liberdade como matéria, no caso humano, necessariamente é o corpo humano e tudo relacionado a ele. O que inclui as sinapses no cérebro, o DNA, os minerais, e tudo que mantêm o corpo em estado vivente enquanto manifestado no Planeta Terra. Portanto, a liberdade como matéria é a manutenção de algo anterior à própria liberdade: a vida do indivíduo.

A liberdade eficiente, portanto, originária, está relacionado à origem do corpo humano que sustenta a vida humana. E a origem do corpo humano é o Planeta Terra. Neste sentido, a liberdade eficiente é a manutenção e uso apropriado do ambiente que permite a existência da matéria humana.

Portanto, considerando estas formulações, concluímos que a potência precisa do corpo. Este corpo precisa de um ambiente para existir, ou seja, do Planeta. A causa final da liberdade, da potencialidade humana, é a preservação da vida humana e planetária, uma vez que sem o Planeta e sem a vida humana sequer teríamos a causa formal, que é a potencialidade.


Conclusão

Isso responde todas as nossas perguntas? De certo algumas. Mas ao mesmo tempo, nos impele a fazer novas questões. Considerando as quatro causas aristotélicas, concluímos que a liberdade está relacionada diretamente a vida. Ela (liberdade) é uma potência direcionada à plenitude (o desejo de máxima expansão). Mas a plenitude só pode ser alcançada por quem tem conscientemente todas as matérias do universo conhecido e não conhecido. Se tal potência infinita não é possível por parte do limitado homem em corpo físico, então a sua plenitude consiste na expansão máxima de sua experiência neste planeta e neste corpo que habita.

Se o planeta é a casa do corpo humano e de todas as suas experiências, então cuidar do planeta é também parte de nossa liberdade. Faz parte de nossa potencialidade como ser. Se, ao contrário, usarmos a potência humana para a destruição, estaríamos contradizendo a causa material e eficiente, de modo a rechaçar toda a definição que nos concede apropriadamente a liberdade em si. Nenhum indivíduo morto possui a capacidade de usar sua potencialidade. Afinal, é morto.

Disso podemos considerar que há também um ethos para a liberdade humana. Uma vez que o ser humano existe e tem consciência de sua existência, ele também tem consciência de todas as coisas que potencialmente pode fazer utilizando os materiais a seu dispor: corpo e planeta. O limite para a potência humana é infinita por natureza, assim como a liberdade em si é infinita (a plenitude só existe no todo). Mas dado que somos limitados por estruturas físicas específicas, precisamos considerar que nossa liberdade está relacionada à existência em si como dada pela natureza. Negar a existência, negar a vida é negar a própria liberdade. 


Vídeo 2 - Reflexão



Por Sasha Lamounier

Grato pela leitura,

Porto, Portugal
11 de Novembro de 2015