O Libertário Karl Marx
Por
Sasha Lamounier
Introdução
Há duas formas de interpretar a história.
Antes de tudo, pela fonte primária. Ou seja, quem esteve lá, quem escreveu
aquilo, quem fez aquilo outro e quem presencialmente fez o objeto de análise da
história. Depois, pode-se averiguar a história por quem estuda a história, ou
seja, por quem documenta e comenta as fontes primárias.
Quando falamos de Karl Marx, milhões de
pré-conceitos (conceitos sobre algo preconcebidos) surgem. O comunista vai
pensar que se trata de Jesus Cristo e o liberal pensará que se trata do
demônio. Mas a rigor, tanto um quanto outro está errado. Analisar um evento
passado ou uma personalidade do passado com os pesos e contrapesos que temos
hoje é o primeiro dos erros, que o próprio Karl Marx cometeu em suas análises.
Max Weber (grande sociólogo liberal) fundamentou o que ele chamaria de “sociologia
compreensiva”. Em suma, é a prática de analisar sociedades com base em seu
sistema de valores, não na nossa.
E é isso que falta hoje em dia.
Naturalmente, temos a tendência de analisar tudo do ponto de vista de nossa
época histórica. Afinal, trata-se de nossa realidade. O que conhecemos de Karl
Marx é o que pessoas interessadas em seu nome nos falaram. Desde professores esquerdistas
até opositores ultradireitistas. Vamos, portanto, fazer um exercício neste
texto. Tentemos por um simples momento ignorar o que já sabemos sobre este
personagem e vamos pensar através das premissas fundamentais. Nunca iremos
entrar na cabeça dele para saber o que realmente ele pensava e qualquer
tentativa semelhante seria equivalente a mentir. A única forma que temos de
analisar uma personalidade é nos colocando no lugar dela. Pois deste modo,
observaremos o mundo como se fôssemos nós aquela pessoa, no mesmo contexto de
vida, de sociedade e mesmo de intelectualidade.
Pequena Biografia
Karl Marx em 1836
Karl Marx nasceu em 1818, filho de mãe e
pai judeus. Seu pai, advogado de origem rabina, Heinrich Marx, se converteu ao cristianismo
luterano por razões políticas e sociais. Com isso, os nove filhos da família
Marx (incluindo Karl) receberiam uma educação luterana liberal. Karl Marx foi
educado em casa até os 12 anos de idade. Em 1835, aos 17 anos, ele se
matriculou na Universidade de Bonn, onde pretendia cursar filosofia e história.
Mas por influência do pai, acabou iniciando o curso de Direito. Começou a ter um inicio de vida estudantil
boêmia e suas notas não eram boas. Por conta disso, seu pai o obrigou a
transferir-se para a mais conceituada Universidade de Berlim, onde Karl
abandonou o Direito e finalmente iniciou os estudos em filosofia e história.
Quando se matriculou na Universidade de Berlin, Georg Wilhelm Friedrich Hegel era professor e reitor na mesma instituição (1830). Este seria um dos principais influenciadores do pensamento marxista. Lá, Karl integraria o grupo chamado de “Jovens Hegelianos”, que nada mais era do que um grupo de jovens estudantes e professores da Universidade de Berlim após a morte de Hegel (datada em 1831). Marx também integrou o Clube dos Doutores, liderado pelo filósofo e professor de Marx, Bruno Bauer. Este o introduziu as ideias de Hegel. Marx interessou-se especialmente pela ideia de oposição (rico-pobre, mestre-escravo, felicidade-tristeza), na qual Hegel defendia que seria superada com o processo histórico da dialética (tese e antítese), atingindo-se assim a unidade (totalidade) - síntese.
Quando se matriculou na Universidade de Berlin, Georg Wilhelm Friedrich Hegel era professor e reitor na mesma instituição (1830). Este seria um dos principais influenciadores do pensamento marxista. Lá, Karl integraria o grupo chamado de “Jovens Hegelianos”, que nada mais era do que um grupo de jovens estudantes e professores da Universidade de Berlim após a morte de Hegel (datada em 1831). Marx também integrou o Clube dos Doutores, liderado pelo filósofo e professor de Marx, Bruno Bauer. Este o introduziu as ideias de Hegel. Marx interessou-se especialmente pela ideia de oposição (rico-pobre, mestre-escravo, felicidade-tristeza), na qual Hegel defendia que seria superada com o processo histórico da dialética (tese e antítese), atingindo-se assim a unidade (totalidade) - síntese.
Após a faculdade, Marx teve uma vida intelectualmente
agitada, porém pessoalmente conservadora. Seu pai havia falecido e precisaria
agora se sustentar. Casou-se com a filha de um barão prussiano, Jenny Von Westphalen
(com quem contraiu noivado ainda na faculdade). Ateu por convicções intelectuais,
Karl tornou-se Doutor em 1841, com a tese “Diferenças da filosofia da natureza
de Demócrito e Epicuro”. No mesmo ano, viu Bruno Bauer (um ateísta e seu mentor),
ser formalmente impedido de atuar academicamente por conta de sua convicção
religiosa e seu radicalismo. Tal fato Marx consideraria sinal de clara
impossibilidade de seguir a vida como professor. Foi quando se tornou redator
chefe da Gazeta Renana, um jornal da província de Colônia. Lá, conheceria
Friedrich Engels. Em 1843, a Gazeta Renana seria fechada pelo governo
prussiano, devido aos ataques que o jornal publicava contra o governo. Por
conta disso, Marx mudou-se para Paris, onde se tornou diretor de um jornal
franco-alemão (Anais Franco-alemães). Na França, começaria a ter contato com os
primeiros socialistas clássicos (posteriormente por ele denominados utópicos)
nas mais diversas sociedades socialistas francesas. Ao longo da vida, Marx
também teria contato com Proudhon (com quem teve várias divergências) e Bakunin
(ambos anarquistas). Continuaria publicando por toda a vida e trabalhando com
Engels em seus escritos. Passaria por diferentes jornais e seria expulso de
outros países, na grande maioria das vezes a pedido do governo prussiano. Ao
final da vida conseguiu estabelecer residência oficial em Londres, onde faleceu,
em 1883.
Sua vida privada era típica da época.
Suas filhas aprendiam piano, canto e desenho, como as moças aristocráticas. Perdeu
alguns filhos por conta de doença e condições precárias de momentos de sua
vida. Como também teve uma filha bastarda com uma militante socialista e
empregada dele, Helena Demuth, para quem pagaria pensão. Marx viveu de seus
salários e da herança deixada por seu pai. Assim como, recebeu em momentos de crise,
ajuda financeira de amigos.
Karl Marx e a esposa Jennny
Entendendo Karl Marx
Em resumo, Karl Marx era um homem de seu
tempo. Nada de extraordinário. Era um capitalista 100% (talvez mais do que ele
mesmo queria aceitar). Era um homem conservador, aristocrático, que foi tendo
contato com diferentes ideologias e pensamentos ao longo da vida. Teve contato
com o liberalismo na faculdade, através de Hegel. Leu David Ricardo, Adam Smith
e filósofos antigos, como os gregos clássicos. Teve contato com os escritos de
Rousseau, dos socialistas clássicos franceses, com anarquistas e, enquanto isso
procurava entender o século em que vivia. Marx foi fruto do que leu, do que percebeu e do que entendeu.
O século XIX foi um século de
revoluções. Só na década de 1830, a Europa passou por revoluções na Bélgica,
Polônia, nos Estados italianos, nos Estados alemães, em Portugal e na Espanha. Houve
ainda as revoluções de 1848! Além disso, os centros urbanos alteravam sua
paisagem social, por conta do crescimento das indústrias e a imigração de
homens e mulheres do campo para as grandes cidades europeias, o que gerava
pobreza. A agitação política era grande. Se hoje vemos a América Latina e o
Brasil com problemas políticos, imagine na Europa do século XIX. O século
pós-Napoleão, século pós-iluminismo, pós-Revolução Francesa, onde os ideais
humanistas estavam à flor da pele, onde a ciência estava tornando-se a senhora
da razão e a religião perdia força.
Foi neste século, neste conturbado
século, que surge Karl Marx.
Como eu disse no começo do artigo, é
impossível entrar na cabeça dele para saber exatamente o que ele pensava. Mas
fazendo aquele exercício de se colocar no lugar dele, podemos fazer uma
reflexão mais ou menos precisa e que possui base e fundamentação histórica.
Primeiro, em casa Marx teve uma formação
luterana liberal, portanto conservadoramente cristã e protestante. Na
faculdade, teve acesso às ideias liberais, assim como questionou a religião.
Conheceu a dialética de Hegel e a ideia do “fim da história”, onde Hegel apontava
para o fim dos processos de mudança históricos, atingido assim um equilíbrio
representado como o apogeu do liberalismo e da igualdade jurídica. E na prática
da vida, conheceu a brutalidade dos governos de sua época, viu nas grandes
cidades problemas sociais novos (que até então nunca haviam sido estudados por
cientistas políticos a sério). Questionou o sistema em que vivia. Especialmente
o Estado que lhe obrigava a se calar diante dos ataques que concedia. Via de
perto as relações entre burguesia e velha aristocracia. Ele mesmo casou-se com
uma baronesa. Ele viveu o século XIX com todo o seu requinte.
Portanto, pode-se dizer que o jovem
garoto que se interessava por história e filosofia, tornou-se um grande crítico
de tudo na faculdade. Quando saiu da faculdade e foi viver a vida, deparou-se
com uma realidade dura e aplicou a esta realidade tudo aquilo que tinha
conhecido nos anos de estudo. Ao longo desse processo, foi conhecendo outras
ideologias, que viviam a MARGEM da academia (o socialismo e a anarquia não era
uma bandeira acadêmica na época de Karl Marx). Este intelectual questionou o
poder dos Estados de sua época (os Estados pós-iluminismo). Foi um crítico do
poder. Defendeu que os menos afortunados neste grande jogo de poder saíssem dos
seus grilhões e levantassem a voz. Foi crítico de um sistema que, na sua ótica, regulava a vida das pessoas e tirava-lhes a liberdade. Sua forma de buscar a liberdade foi propondo maior igualdade entre o que ele chamava de "classes".
Pela
vida que viveu, pode-se dizer com quase total certeza que Marx não acreditava
sinceramente na própria utopia (o comunismo de Marx era equivalente ao fim da
história de Hegel, mas entendido através do materialismo histórico). Se
acreditasse, teria abandonado a aristocracia para fazer revolução armada, algo
que ele nunca pensou em fazer. Como intelectual Marx foi um revolucionário do
pensamento padrão. Como bom
hegeliano, ele tomava como pressuposto a análise dialética da história, ou
seja, em seus resultados práticos e as analisava criticamente, trazendo para a
sua realidade. É o que o Olavo diz quando afirma que "todo filósofo tem
como parâmetro de análise a sua própria realidade". Não posso fazer
filosofia sobre o passado e nem sobre o futuro, mas sobre a realidade que vivo
e na qual nasci.
Conclusão
Karl Marx na velhice
Depois de sua morte, o que surgiu foram
INTERPRETAÇÕES do que foi por ele escrito. Interpretações estas passíveis de
mudar de sentido devido ao CONTEXTO de quem as leram. Se Karl Marx vivesse hoje
em dia, provavelmente seria fã de Edward Snowden. Seria um libertário,
defendendo uma reforma política total, o fim do corporativismo, o fim das
regalias dos políticos, seria a favor da Internet livre, da livre circulação de
informações e seria totalmente a favor da tecnologia (que tira o homem do
trabalho mecanizado e lhe dá tempo para estudar e fazer o que gosta). Se Karl
Marx tivesse tido acesso em sua época à teoria marginalista (1870), se
realmente tivesse se debruçado a estudar tais teorias, provavelmente acabaria sendo
a favor do livre-mercado também.
As teorias econômicas e sociais de Karl
Marx faziam sentido EM SUA ÉPOCA e em SEU contexto. O mundo mudou muito desde
1883 (ano de sua morte). Dificilmente o próprio Marx manteria a opinião que
tinha no mundo de hoje. Se tivesse lido Carl Menger, Milton Friedman, Ludwig Von
Mises, Friedrich Hayek e outros, provavelmente abandonaria tudo o que pensava.
As críticas de Eugen Von Bohm-Bawek foram publicadas APÓS a morte de Karl Marx,
por exemplo. A primeira em 1889, “Theory of Capital”. E somente em 1896 que
Bawek publicaria o livro “Karl Marx and the Close of His System”.
Se, porém, ele não abandonasse o que pensava,
ao menos refletiria MUITO sobre tudo o que escreveu. Do mesmo modo que conheceu
Proudhon e manteve diálogos com ele, discordando de muita coisa, Karl Marx
provavelmente teria uma postura semelhante com os economistas citados acima. E
se percebesse a diferença entre as teorias do valor-trabalho (que gerou sua interpretação
de mundo) e do marginalismo, muito provavelmente tornar-se-ia defensor de um
sistema pró-consumidores e anti-monopólios. Ou seja, ele seria um grande
libertário.
Mas para a sua época, ele já foi um
libertário. Lutou contra a tirania, defendeu aqueles que eram “explorados”,
promoveu o fim do monopólio da razão (religião) e defendeu a superação da
dualidade. Nada diferente de um libertário hoje em dia, que é contra Estados
que “roubam impostos” do “explorado contribuinte” e defende a máxima liberdade
para os indivíduos, superando assim os “padrões culturais da sociedade
estatista”. O que o libertário é hoje, Karl Marx foi para a sua época.
Mas ao final de tudo, Karl Marx era
apenas um cara que queria melhorar o mundo em que vivia. Sua culpa e seu drama
é o de ter escrito demais o que homens pouco instruídos iriam levar ao pé da
letra.
Que falta faz ao mundo um novo Hegel!
Grato pela leitura,
Sasha Lamounier
Liberal Clássico
Porto – Portugal
08 de Março de 2015.
Excelente!
ResponderExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirMuito bom, Marx foi um homem, não um deus, ou seja não foi perfeito. Entretanto, eu considero a obra de Marx, destaque para "O Capital", uma descrição bem acurada do capitalismo, e um livro Crucial para entender o capitalismo, e também não diria que Marx foi superado, mas que é o começo para qualquer conversa critica sobre o capitalismo.
ResponderExcluirO problema de Marx parece ser que ele não tinha fibra moral para questionar as próprias idéias e muito menos de aplica-las. Era um vigarista. Ao contrário do que uma pessoa normal faz que adapta o pensamento a realidade, Marx queria adaptar a realidade a seu pensamento.
ResponderExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
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