A CAUSA ISRAELITA
Por
Sasha van Lammeren
Desde o último dia 7 de Outubro, quando o Hamas
perpetrou o mais nocivo e absurdo ataque contra Israel e o Premiê Benjamin
Netanyahu declarou guerra ao grupo terrorista, o mundo parece ter se bifurcado
em dois blocos: um pró-Israel e outro pró-Palestina. Como se a guerra entre
Israel e Hamas fosse, na verdade, mais um capítulo da guerra histórica entre
Israel e Palestina. Mas vamos dar alguns passos atrás e tentar perceber o que
de fato está acontecendo aqui.
Parte I
Contexto histórico
Não vou me alongar demais no contexto histórico,
visto que a história de Israel e da região da Palestina perpassa por mais de 5
mil anos, incluindo diversos impérios, guerras e mudanças de nome. Vou me
concentrar em três fatos concretos, aceitos pela historiografia internacional,
para dar o contexto histórico.
a).
Israel sempre foi a terra original dos judeus, não dos Palestinos
b).
O sionismo e o seu objetivo histórico
O nome ‘sionismo’ vem da palavra ‘Sião’, uma
referência a Jerusalém. No final do século XIX, diante do aumento do
antissemitismo na Europa e do desenvolvimento do ‘nacionalismo’ como ideologia,
surge um movimento que defendia a criação de um país para os judeus. Theodor
Herzl, jornalista austríaco-judeu considerado o fundador do movimento, escreveu
um livro chamado ‘O Estado Judeu’ (1896), na qual ele defendia a criação de um
estado judeu na região da Palestina. Este foi o começo do sionismo político.
Contudo, o sionismo como movimento foi muito mais do que isso.
A partir do Primeiro Congresso Sionista (1897),
outros tipos de sionismos surgiram. Entre eles, o trabalhista (ou socialista),
originário da ideia dos Kibutz (sociedades agrárias coletivas inspiradas na
ideia socialista de partilha da propriedade pelos homens). Também surgiu o
Sionismo Revisionista (liderado por Ze'ev Jabotinsky), que defendia a tese de
que o estado judeu deveria se expandir territorialmente (sendo este movimento o
precursor do atual partido Likud). Outra corrente foi o Sionismo religioso, que
enfatizou a importância do Estado de Israel para as profecias religiosas.
Sionismo, portanto, é o movimento que defende a
criação e a permanência do Estado Judeu na região da Palestina. Tão e somente
isso. Os seus críticos acusam Herzl de ter tido posições racistas e puristas,
de modo que o movimento sionista seria (ele todo) racista. Isso não tem
fundamento, pois o movimento sionista (como demonstrado), desde sua origem foi
multifacetado, com diferentes perspectivas sobre o mesmo assunto. Além disso, o
sionismo não é um movimento contrário a outro povo, mas sim a favor do povo
judeu, tão e somente. Árabes e muçulmanos israelenses vivem pacificamente e com
os mesmos direitos políticos que os judeus em Israel (Leis Básicas de Israel,
em especial a Dignidade Humana e Liberdade de 1992).
Se o movimento sionista fosse um movimento puramente
racista, o Estado de Israel não teria surgido com uma ênfase humanista e
inclusive socialista (os kibutz foram importantes políticas israelenses nas
duas primeiras décadas do novo Estado). Os árabes muçulmanos israelenses não
teriam hoje participação no Knesset (parlamento israelense) e não seriam juízes
da Suprema Corte israelense. Os povos não poderiam votar e serem eleitos, não
poderiam formar partidos e não poderiam sequer viver livremente nas cidades de
Israel. É completamente infundado a acusação de racismo ou de apartheid por
parte dos críticos do movimento sionista e de Israel. O objetivo histórico do
sionismo é restabelecer o povo judeu na sua terra originária.
c).
A criação do atual Estado de Israel e sua cronologia
Precisamos retornar ao final do século XIX e começo
do século XX para compreender tanto o Movimento Sionista (acima já referido)
quanto a situação da região da Palestina. O nacionalismo europeu contribuiu
para que judeus vissem a necessidade de terem eles próprios a sua nação, em
especial devido ao antissemitismo disseminado no velho continente. Casos como o
caso Dreyfus (quando Alfred Dreyfus, um oficial judeu francês foi falsamente
acusado de traição), o caso dos progroms na Rússia (violentos ataques contra a
comunidade judaica na segunda metade do século XIX), o aumento do
antissemitismo nas universidades alemãs e na mídia europeia (jornais, revistas
etc.).
Quando na eclosão da primeira guerra mundial
(1914-1918), um conflito entre o Império Britânico (e seus aliados, como
França, EUA) contra o Eixo (formada por Alemanha, Império Austro-Húngaro e
Império Otomano), a situação geopolítica tanto na Europa quanto no Oriente
Médio se alteraram. Tanto o Império Britânico quanto Russo desenvolveram
operações militares na região do Levante, incluindo o Sinai, Síria e a
Palestina. Ao mesmo tempo, em 1917, o Império Britânico através da Declaração
de Balfour declarou apoiar a formação de um lar nacional para o povo judeu.
Com o fim da Primeira Guerra e o colapso do Império Otomano, os Britânicos assumiram o controle da Palestina (naquilo que ficou chamado como Mandato Britânico da Palestina, a partir de 1920, estabelecido pela Liga das Nações – antecessor da ONU). O Mandato Britânico da Palestina incluía a região que hoje é Israel, assim como da Transjordânia (mapa a seguir). Síria e Líbano ficaram sobre o controle francês. Esta partição do antigo Império Otomano se deu através dos Tratados de Sèvres (1920) e de Lausanne (1923).
Desde o final do século XIX, no entanto (ainda no
Império Otomano), os judeus começaram o processo de imigração em massa para a
região da Palestina. A primeira Aliá (como é chamado o processo do retorno
judaico pós-diáspora) ocorreu entre os anos de 1881 e 1903, com judeus vindos do
Iêmen, da Rússia e de outras partes da Europa Oriental para a Palestina
(calcula-se em torno de 25 a 35 mil judeus). Entre os anos de 1904 a 1914,
houve a Segunda Aliá, na qual judeus novamente vindos da Rússia e do Iêmen
vieram em massa para a Palestina, e também polacos. Durante o Mandato Britânico
da Palestina após a Primeira Guerra as Aliá se intensificaram, tornando-se
ainda maior durante e após a Segunda Guerra Mundial (e do Holocausto).
Neste período, é importante compreender que nunca
houve ‘expulsão’ de palestinos de suas casas ou terras, mas sim compras e
negociações. Os conflitos que surgiram no período 1920 a 1948 na região da
Palestina envolviam, muitas vezes, questões políticas e económicas. Os
distúrbios de 1920 e 1921 foram ocasionados pelas tensões entre árabes
contrários a imigração judaica. Em 1929, houve um massacre em Hebron aonde
judeus e árabes morreram as centenas. Estes distúrbios contribuíram para que
grupos judeus criassem forças paramilitares contrários ao Mandato Britânico e a
estes atos violentos árabes (tais como o Irgun e os Lehi).
A situação original da convivência entre judeus e
árabes a esta altura se dividia em três blocos: propriedades privadas judaicas,
propriedades privadas árabes e propriedades públicas (controladas pelo Mandato
Britânico e não pertencente nem a árabes ou a judeus). O mapa a seguir elucida
isso. Em 1936, os árabes da Palestina resolvem se reunir politicamente através
da Alta Comissão Árabe. Nela, estabeleceram que toda a região da Palestina
pertencia aos árabes e reclamaram para si este direito, exigindo a expulsão dos
judeus. Esse evento marca o precursor da ‘Causa Palestina’ e da negação da existência
do Estado de Israel por parte do mundo árabe.
Em 1947, a ONU aprovou o
plano de partilha da Palestina (mapa). Nela, se propunha a divisão da região da
Palestina em dois estados. Um judaico, outro árabe e Jerusalém tornando-se a
capital dos dois Estados (partilhada). Este evento fez com que os árabes se
revoltassem ainda mais, conclamando a expulsão dos judeus e o estabelecimento de
uma Palestina ‘apenas’ árabe e muçulmana. Este evento marcou a guerra civil
árabe-israelense de 1947, o prelúdio da guerra de independência.
Em 1948, os Britânicos retiram suas forças da
região, deixando a região num estado crescente de anarquia. Em 14 de Maio do
mesmo ano, os judeus declaram a independência de Israel. Logo a seguir, países
da Liga Árabe (Egito, Síria, Transjordânia – atual Jordânia -, Líbano e Iraque)
invadem o recém-formado país judeu. Os israelenses lutaram sozinhos, tendo
apoio de judeus do mundo todo como único apoio internacional. Motivados,
coordenados e unificados, eles conseguiram vencer as forças desorganizadas dos
árabes e, com isso, estabelecer finalmente o seu Estado judaico.
Parte II
Israel e Palestina: um conflito de negações e negociações
Desde 1948 e a formação do Estado judeu, Israel
nunca mais teve paz concreta. Após a guerra de independência, tanto judeus
quanto árabes sofreram com o deslocamento em massa de suas populações. Devido a
conquista, as nações árabes ordenaram que os palestinos que viviam em
território israelense se retirassem da região, do mesmo modo que muitos judeus
foram expulsos dos países árabes. Esta situação ficou conhecida como ‘Nakba’, aonde
muitos palestinos foram ou para outros países árabes, ou se refugiaram na
Cisjordânia ou em Gaza.
A situação continuou tensa ao longo das décadas
subsequentes, com destaque para a Guerra de Suez (1956), Guerra dos Seis Dias
(1967) e a Guerra do Yom Kippur (1973). Após a Guerra dos Seis Dias, quando
Israel foi hostilizado pelo Egito e Síria e tiveram de, mais uma vez, lançar
mão de uma guerra defensiva, a situação geopolítica de Israel mudou.
Conquistando o Sinai no Egito e as Colinas de Golã na Síria, o status de Israel
passou ao de potência regional. A partir daí os conflitos subsequentes deixaram
de serem entre estados árabes e Israel e tornaram-se guerras de guerrilha (e
terrorista).
Também durante a Guerra dos Seis Dias, Israel conquistou
parte da Cisjordânia, Faixa de Gaza e Jerusalém Oriental. A atual situação
destas regiões é originária destas conquistas. Desde então, colonos israelenses
tem estabelecidos colonias na Cisjordânia, aumentando a presença dos mesmos na
região. A criação da Organização para a Libertação da Palestina (OLP), por
Yasser Arafat (fundador do Fatah, partido originário da Cisjordânia) marcou a
nova relação entre Israel e a Palestina, com o Hamas surgindo nos anos 1980 na
Faixa de Gaza.
Entre os diversos tratados e conversações entre as
partes, destaquei a seguir os eventos mais importantes para compreender como
chegamos ao estado de coisas atualmente.
Contexto: ocupação israelense de Gaza e Cisjordânia pós Guerra dos Seis Dias
(1967), além da ocupação israelense do Sinai (Egito), Colinas de Golã (Síria) e
Jerusalém Oriental (Cisjordânia).
I.
Acordos de Camp David (1978);
Nestes acordos, mediados pelos EUA no mandato de Jimmy Carter, Israel e Egito normalizaram suas relações diplomáticas. Israel devolveu o Sinai para o Egito, em troca do reconhecimento de sua existência por parte do país árabe e da aproximação entre ambos os estados. Embaixadores foram trocados, acordos comerciais foram estabelecidos e a relação Israel-Egito tornou-se não mais conflituosa.
II. Guerra do Líbano e Acordo de Retirada (1982);
Em 1982, Israel invadiu o Líbano com o objetivo de retirar a liderança Palestina que estava alojada na capital do país, Beirute. Este ataque, que marcou a guerra entre Líbano e Israel, levou a um tratado na qual a OLP (Organização para a Libertação da Palestina) deixaria o país. Neste conflito, surgiu o Hezbollah, grupo terrorista financiado pelo Irã e contrário a existência de Israel.
III.
Declaração de Autonomia Palestina (1988):
Em 1988, o Conselho Nacional Palestino (CNP) proclamou a independência do Estado da Palestina em partes da Cisjordânia e da Faixa de Gaza, e a OLP reconheceu a Resolução 242 do Conselho de Segurança da ONU (que versava sobre a retirada de Israel das regiões ocupadas e pela integridade dos territórios palestinos da Partilha) e a Resolução 181 da Assembleia Geral da ONU (sobre a repartição da Palestina proposta em 1947). Essa ação abriu caminho para negociações subsequentes.
Entre os anos 1988 e 1993 houve a Primeira Intifada (movimento revolucionário palestino), quando os Palestinos se revoltaram contra a ocupação Israelense de Gaza e Cisjordânia. Este evento permitiu as futuras negociações de Paz no que ficaram conhecidos como Acordos de Oslo.
IV.
Acordos de Oslo (1993 e 1995);
Estes acordos foram uma série de negociações entre Israel e a Palestina, mediados pelos EUA sob o comando de Bill Clinton, na cidade de Oslo, na Noruega. Este acordo previa os seguintes pontos:
a). A retirada das forças israelenses da Faixa de
Gaza e da Cisjordânia, assim como a garantia do autogoverno por parte da
Autoridade Palestina.
b). O autogoverno seria dividido da seguinte forma:
- Área A: Controle total pela autoridade palestina
- Área B: Controle civil pela autoridade palestina e
militar pelo Estado de Israel
- Área C: Controle total
pelo Estado de Israel
c). O reconhecimento mútuo, por parte de Israel e da Palestina, das autoridades de ambos os estados e governos, como estabelecido em tratados anteriores pela ONU e reconhecidas internacionalmente.
Tais acordos, contudo, não foram contemplados na sua
totalidade por diferentes fatores. Um deles foi a mudança de postura das lideranças
políticas na Palestina, em especial na forma conservadora com que certas
alas do estado palestino viam os acordos. Em resposta a este
fracasso, houve a Segunda Intifada
(2000-2005), desta vez muito mais violenta do que a primeira. Como consequência
da Segunda Intifada e da guerra civil na Palestina (entre Fatah e Hamas),
Israel saiu unilateralmente de Gaza e manteve os assentamentos na Cisjordânia.
Com o Hamas tendo assumido o poder total de Gaza a
partir de 2007 e a Fatah governando as regiões autónomas da Cisjordânia, este ficou o status quo até recentemente. A partir de 2020 começam as negociações que ficaram conhecidas como Acordos de
Abraão e que poderiam mudar este cenário.
V.
Acordos de Abraão (2020-2023);
Mediados pelos EUA a partir da administração Trump (2020), os acordos de Abraão visavam a normalização da relação entre Israel e os estados árabes. Nesta normalização, abria-se espaço para a questão Palestina, ratificando os acordos de Oslo e alterando a realidade da ocupação israelense da Cisjordânia. Tais acordos foram firmados, primeiro, entre os Emirados Árabes Unidos e Israel, e posteriormente por Sudão, Marrocos, Omã, Bahrein e Jordânia com Israel. Em 2023, a administração Biden estava muito perto de conseguir que a Arábia Saudita (de tradição sunita e árabe, assim como os Palestinos), assinassem também o acordo de Abraão. Deste modo, seria mais uma grande nação árabe a reconhecer Israel e seu direito de existir, assim como, em trocar embaixadores.
No mapa acima, em verde estão as nações envolvidas nos Acordos de Abraão e em vermelho estão os estados e grupos terroristas hostis a Israel (Irã, sendo o principal financiador do Hamas em Gaza e do Hezbollah no Líbano, assim como dos Hutis no Iêmen). Oficialmente, os governos do Líbano, Síria e Iraque não possuem posição formalmente beligerante ou amistosa com Israel, estando estes engolfados nas suas próprias pelejas internas.
Observe que, na fronteira com a Síria, ainda estão as Colinas de Golã sobre controle israelense, desde o cessar-fogo pós 1967 e 1982.
Parte III
Os ataques do Hamas e o conflito atual: verdade e narrativa
No dia 7 de Outubro de 2023, o Hamas (grupo
terrorista que controlava Gaza desde 2007), lançou um ataque feroz contra o sul
de Israel. O objetivo não eram instalações militares, mas sim, civis. Foi
inteiramente um ataque hediondo contra a sociedade civil israelense. Como este
ataque aconteceu a despeito das medidas de segurança de Israel, ainda está sob
debate e escrutínio. No entanto, é seguro afirmar que foi um ataque planejado
por meses a fio e com financiamento internacional (no caso, do Irã). Geopoliticamente falando, o objetivo dos ataques eram o de impedir que Israel fechasse o acordo com a Arábia Saudita, visto que isso seria uma pedra no sapato do Irã (adversário histórico dos Sauditas).
Rapidamente as Forças de Defesa de Israel (IDF na
sigla em inglês) readquiriram controle dos territórios e impuseram um cerco a
Gaza. Desde então estão sendo criticados por algumas entidades internacionais. Nesta
parte do artigo, pretendo apresentar uma cronologia de eventos, suas
consequências, e também o respaldo pela lei internacional tendo por base a
verdade (e não a narrativa veiculada pela imprensa sem comprovação factual).
Disclaimer: todo flagelo contra civis não-beligerantes é uma
tragédia, especialmente aquelas que afligem crianças, idosos e pessoas
inocentes. É dever de toda a comunidade internacional e esclarecida condenar,
seja por parte da Palestina ou de Israel, abusos contra os direitos humanos.
Vamos aos fatos:
1. Em 2005, Israel saiu unilateralmente de Gaza, permitindo que os
palestinos se autogovernassem na região.
2. Em 2007, depois de um conflito local entre a Fatah e o Hamas, o grupo
Hamas tomou o poder na Faixa de Gaza, criando riscos diretos à segurança de
Israel.
3. Desde então e por conta desta tomada de poder, Israel criou um bloqueio
marítimo, aéreo e terrestre para impedir que o Hamas fizesse ataques ao país.
4. Devido a este bloqueio, Israel ficou responsável pelo fornecimento de
mercadorias alimentares e de subsistência aos habitantes da Faixa de Gaza.
5. Por conta deste contexto, a ONU e demais instituições internacionais
tem feito esforços humanitários, buscando diminuir a escassez do povo palestino
em Gaza.
6. Estas ajudas humanitárias, contudo, não tem contemplado os palestinos
de Gaza, visto que há abundantes denúncias internacionais do uso indevido
destas ajudas pelos membros do Hamas.
O Hamas, historicamente, nunca reconheceu o Estado
de Israel e mantém uma atitude beligerante diante do país desde sempre. O Hamas
aceita apenas negociar nos seus termos, isto é: o fim do Estado de Israel e a
entrega de todos os territórios do país para a Palestina. Nada mais e nada
menos. Postura oposta ao da Fatah, que desde 1988 reconhece Israel e defende a
solução de dois estados (em acordo com a proposta de Partilha de 1947, ou a
Resolução 181 da Assembleia Geral da ONU).
Ao declarar guerra ao Hamas, Israel deixou claro que
seu inimigo não é o povo palestino, mas sim, o grupo terrorista que quer um
genocídio judeu. O Hamas não é ‘resistência’ armada dos palestinos, não são
defensores do povo palestino e tampouco estão preocupados com fazer a paz. Tudo
o que o Hamas quer efetivamente é acabar com Israel, dominar toda a região e
implementar um governo radical islâmico a exemplo do Califado do ISIS.
Portanto, vamos entender o contexto.
O Hamas controla uma área urbana composta por 2
milhões e 200 mil palestinos. Dentro deste território, eles se escondem em
redes de túneis por baixo de Gaza que perpassa hospitais, escolas, residências
e ruas. O Hamas roubou ajudas humanitárias enviadas pela ONU para o povo
palestino de Gaza, e ainda recebeu financiamento e apoio logístico por parte do
Irã e de seus líderes que vivem no Catar (Mousa Abu Marzook, por exemplo, é um
dos líderes sénior do Hamas, bilionário e que vive no Catar, longe da pobreza que
o seu povo vive).
Israel, logo após os ataques de 7 de Outubro,
cercou Gaza precisamente para impedir novos ataques por parte do Hamas. Desde o
dia 7 Israel sofre ataques vindos do Hamas, desde foguetes até ameaças com
relação aos reféns israelenses que ainda estão sob o controle do Hamas. Nenhuma
agência internacional de inteligência é capaz de destruir o Hamas sem com isso
bombardear e atacar aonde o Hamas opera. E é aqui que entra a questão que tem
sido fruto de controvérsia nos últimos tempos.
Para explicar o que Israel está fazendo e o que
respalda as Forças de Defesa de Israel nas suas operações, é preciso que o
leitor entenda o básico do direito internacional e dos tratados aceitos
multilateralmente pelos diversos estados-nação e atores não nacionais.
O direito de Israel se defender
De acordo com a Carta das Nações Unidas, em seu
Artigo 51, ‘nada na presente Carta
prejudicará o direito inerente de legítima defesa individual ou coletiva no
caso de ocorrer um ataque armado contra um Membro das Nações Unidas, até que o
Conselho de Segurança tenha tomado as medidas necessárias para a manutenção da
paz e da segurança internacionais’.
Ou seja, nenhum artigo da Carta das Nações Unidas é
contrário ao direito de Israel se autodefender contra o Hamas e de fazer a
guerra contra o agressor, de modo a preservar a segurança de seus cidadãos e
também salvaguardar a paz em seu território. A partir disso, temos que a guerra
entre Israel e Hamas é justa e dentro do que estabelece o direito
internacional. Agora, a questão é: como essa guerra deve ser combatida? Se o
Hamas é conhecido por usar os palestinos como escudos humanos, se os túneis do
Hamas estão espalhados por debaixo de prédios civis e não-militares, como
Israel pode combater este tipo de adversário?
Lembrando que Israel precisa seguir o Direito Internacional, já o Hamas (por
ser um grupo terrorista e que age à margem do direito), não precisa.
Primeiro, temos de lembrar que o Direito Internacional Humanitário é claro na defesa dos civis e na distinção entre partes beligerantes e partes não-beligerantes. Contudo, há exceções para isso. Para compreender, temos de ir à Convenção de Genebra (e seus Protocolos Adicionais) e ao Estatuto de Roma.
No Protocolo Adicional I à Convenção de Genebra
(1977), em seu artigo 13, temos que ‘a
protecção devida às unidades sanitárias civis apenas poderá cessar se aquelas
forem utilizadas para cometer, fora do seu objectivo humanitário, actos nocivos
ao inimigo. No entanto, a protecção cessará somente quando uma notificação,
fixando, sempre que a tal houver lugar, um prazo razoável, ficar sem efeito.’.
No dia 10 de Outubro de 2023, Israel avisou a todos os
habitantes do norte da Faixa de Gaza a se dirigirem para o sul, pois aquela
região seria lugar de conflito entre as Forças de Defesa de Israel e o Hamas. O
grupo terrorista, ao invés de permitir que seu povo fosse para o Sul como
solicitado por Israel, os proibiu de sair de suas casas e da região de
conflito, numa clara tentativa de – mais uma vez – usar os palestinos como
escudo. Os bombardeios israelenses tiveram, sempre, o foco de atingir unidades
militares do Hamas (diretas ou a partir de construções civis).
Quando o Hamas utiliza estruturas civis para sua
própria proteção, eles incorrem em crime de guerra, exposto no Protocolo no
parágrafo 4 do Artigo 12:
4 - As
unidades sanitárias não deverão em qualquer circunstância ser utilizadas para
tentar colocar objectivos militares ao abrigo de ataques. Sempre que possível,
as Partes no conflito procurarão situar as unidades sanitárias de maneira que
os ataques contra objectivos militares não ponham aquelas em perigo.
A fronteira sul de Gaza não é controlada por Israel,
mas sim, pelo Egito. Mais precisamente no ‘Ponto de Passagem de Rafah’, cidade
do sul de Gaza. É ali aonde os refugiados do atual conflito estão amontoados e
também por ali que os caminhões de ajuda humanitária passam, do Egito para
Gaza. Se os refugiados de guerra ou as ajudas humanitárias não chegam a Gaza a
partir desta fronteira, o responsável é o governo do Egito (não de Israel).
Respeitando o direito internacional, Israel criou um
corredor humanitário para o Sul de Gaza e alertou com antecedência que todo
civil no meio do fronte deve sair da linha de tiro, uma vez que há um conflito
em andamento entre o Hamas e as forças israelenses. Os Estatutos de Roma
corroboram o direito de Israel atacar unidades sanitárias ou civis, desde que estes
estejam sendo utilizados pelo inimigo como meio de causar danos ao adversário.
Apenas é considerado crime de guerra os ataques
perpetrados por um estado beligerante com o único e exclusivo objetivo de
causar danos a população civil não-beligerante no conflito. Isto é, atacar
civis que não estão envolvidos de nenhum modo com o inimigo no combate. Fora
isso, em acordo com o Protocolo, se a estrutura ou unidade civil é usada para
causar danos ao adversário, ele se torna um alvo legítimo.
Aqui, é importante que dois princípios sejam
observados:
1º. O princípio da distinção (entre civis e militares);
2º. O princípio da proporcionalidade;
Neste momento, o que temos são os eventos
denunciados e o conflito aberto entre Israel e Hamas. Para averiguar
concretamente se houve ou não crime de guerra perpetrado por Israel, teremos de
ir caso a caso, com fatos bem documentados e independentes, para confirmar se
de fato havia intenção, se havia causalidade inadvertida e se os dois
princípios acima foram ou não respeitados. Israel, contudo, tem afirmado
sistematicamente e promovidas evidências de que estão agindo em conformidade
com o direito internacional, justificando seus alvos e ataques.
Já da parte do Hamas, não há dúvidas de que houveram
crimes de guerra declarados. Os terroristas não apenas sequestraram, mas também
mataram de forma hedionda civis (crianças, bebês, mulheres, idosos, homens) em
vilas, em um concerto de música, em cidades pacíficas e não-militares. O
fizeram com uma GoPro em seus corpos, filmando tudo e registrando os atos de
maneira vil e premeditada. Isso é um crime de guerra indefensável e
incalculável que deveria ser levado ao Tribunal Penal Internacional.
Conclusão
Não existem dois lados iguais neste conflito.
Não conseguiria em um artigo online versar sobre
todos os pormenores deste conflito, desde sua história até os eventos mais
recentes. O que busquei aqui foi dar ao leitor uma qualitativa oportunidade de
ver os fatos a partir de uma perspectiva mais realista e mais austera. As
coisas são o que são, e elas independem das narrativas. O argumento de que ‘Israel
não deveria existir’ é antissemita, pois não condiz com a realidade histórica
dos fatos. O argumento de que Israel é um Estado terrorista também é antissemita,
pois não condiz com a estrutura mesma do Estado de Israel. E mais grave ainda,
ir para as ruas ou militar na Internet, de modo a direta ou indiretamente
reforçar o argumento do Hamas, é tão vil quanto os próprios ataques do dia 7 de
Outubro.
O Mandato Britânico da Palestina gerou um estado
árabe chamado Jordânia, e um judeu chamado Israel. A ideia de um Estado da
Palestina surge em meados de 1930 em resposta a imigração judaica na região e
por conflitos políticos de domínio da terra, não por uma questão colonialista
como alguns detratores tentam fazer parecer. Judeus e árabes negociaram a compra
e venda de terras entre si, não houve uma imposição militar. Os conflitos
militares começam a surgir durante o Mandato Britânico por conta do controle
britânico das terras públicas.
Palestinos que ficaram em Israel depois da
independência, se tornaram israelenses árabes e muçulmanos. E lá vivem com seus
direitos preservados. Toda a tragédia que acomete o povo palestino, tanto em Gaza
quanto na Cisjordânia, se deve a conflitos perpetrados pelo mundo árabe contra
a presença judaica na região. Isso tem de ser dito, pois ao contrário do que os
marxistas internacionalistas tentam fazer parecer, Israel não é uma força ‘colonialista’
europeia na região. Pelo contrário, os judeus foram abandonados a própria sorte
em 1948 com a saída unilateral dos Britânicos. Nos primeiros anos da Guerra
Fria, Israel teve apoio da União Soviética. Depois, começou a ter apoio
norte-americano (e por interesse geopolítico deste, não de Israel).
Não há dois lados 'iguais' neste conflito. Israel ainda é um estado plural, ocidentalizado e respeitador dos direitos humanos. Sempre o foi. Já o Hamas não, são apenas terroristas. Israel tem feito grande esforço pela paz, pela solução de dois estados. O mundo árabe começou finalmente a caminhar nesta direção. É nosso dever, como liberais, como humanistas, não permitir que os ataques do Hamas faça com que este esforço coletivo caia por terra.
Israel veio para ficar. E enquanto uma boa parte do
mundo Ocidental (em específico as esquerdas) e oriental (os muçulmanos e árabes
radicais) não aceitarem este fato, iremos continuar a assistir mais sofrimento,
mais guerra e mais destruição.
Se a sua pergunta é ‘até quando’? A resposta é simples:
até onde tiver de ser.
Obrigado pela leitura!
08 de Novembro de 2023
Sasha van Lammeren
Jornalista
Mestre em Comunicação Política
Doutorando em Ciência Política
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